Em viagem recente à China, o presidente Lula fez uma pergunta: ‘Quem é que decidiu que era o dólar a moeda?’. Bem, o mundo decidiu; e decidiu em dois processos, um natural e outro formal.
O processo natural
O processo natural se iniciou com o crescimento da economia dos EUA a partir da segunda metade do século XIX. Com as altas taxas de crescimento econômico e financeiro, não demorou para o dólar se tornar uma alternativa à libra esterlina como moeda reserva internacional, o que se consolidou com a 1ª Guerra Mundial.
Mas em 1944, com a proximidade do fim da 2ª Guerra Mundial, os países aliados se reuniram na cidade de Bretton Woods e construíram o modelo financeiro do pós-guerra, no qual o dólar assumiu formalmente a posição central.
Essa mesma reunião viu a criação do Banco Mundial, que ajudaria a reconstruir a Europa com dinheiro americano, e do Fundo Monetário Internacional (FMI), que daria solidez financeira ao sistema acordado.
Essa é a história resumida de quem decidiu e como. Mas por que o peso do dólar ainda continua?
Por que o peso do dólar ainda continua?
Em primeiro lugar, vale olhar um conceito econômico chamado ‘externalidade de rede’. Muitas vezes um produto é líder no mercado simplesmente porque ele é o líder do mercado. É mais barato, seguro e racional seguir com o líder em muitos dos casos. O sistema financeiro construído desde o século XIX simplesmente torna o dólar muito superior a outras moedas.
Além disso, as alternativas ao dólar devem ser capazes de suportar eventuais déficits no balanço de pagamentos. O fato de os americanos gastarem mais dólares no mundo do que recebem é o que garante a estabilidade do comércio, dos investimentos e das reservas internacionais. Mas isso gera pressões políticas internas que Europa e China não parecem dispostas a assumir.
Por fim, a criação de uma alternativa global ao dólar deve ser sustentada por alguma estrutura internacional de governança. Desde o pós-guerra, os EUA têm sustentado boa parte dos custos de manutenção da ordem monetária internacional. Por exemplo, ainda hoje o país é detentor de 17,5% das cotas do FMI, tendo importante papel na definição da agenda e das decisões do órgão.
Enquanto alterações estruturais não se tornem realidade, o dólar seguirá sendo a moeda mais eficiente globalmente, mesmo abrindo espaço para moedas concorrentes no portfólio de reservas internacionais de bancos centrais ao redor do planeta.
Autores:
- Reginaldo Nogueira, diretor sênior do Ibmec;
- Pietro Rodrigues, professor e coordenador do curso de Relações Internacionais no Ibmec SP;
Artigo publicado no jornal O Estadão: clique aqui para ler na fonte.