Observatório das Américas – Desafios externos para a inserção econômica das Américas

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Por Mário Schettino Valente | Cientista Político e professor de Relações Internacionais do Ibmec BH.

As grandes crises catalisam as transformações na sociedade internacional. O atual momento não é diferente, e há diversas projeções. No campo das relações econômicas internacionais, destaca-se a aceleração da regionalização das cadeias globais de valor – isso é a reorganização do conjunto de atividades necessárias à produção para uma área geograficamente mais próxima.

Essa projeção advém do diagnóstico de que a crise sanitária mundial potencializou dificuldades comuns na dispersão das etapas de produção, como os custos de logística e de negociação comercial. Nada mais ilustrativo dessas dificuldades que o calvário sobre as vacinas que temos acompanhado, com desafios envolvendo o transporte de insumos, coordenação de atividades em diferentes fusos, assimetrias de informação, diferenças de legislações. Ante esses problemas, a regionalização das cadeias de valor permite maior coordenação e controle do processo produtivo pelas empresas e pelos Estados.

As transformações econômicas mundiais tornam esse cenário preocupante para as Américas porque, nas décadas recentes, observa-se uma emergência econômica mais intensa nos países da Ásia-Pacífico. Relatório do Brookings Institution estima que, nos próximos dez anos, essa região aumentará tanto o número de pessoas na classe média quanto a capacidade de consumo dessa parcela da população, que passará de US$ 18 trilhões para US$ 36 trilhões. Por outro lado, o mesmo relatório mostra uma relativa estagnação da capacidade de consumo da classe média nas Américas e em uma de suas principais parceiras comerciais, a Europa.

Os países americanos, portanto, precisam traçar estratégias de inserção econômica internacional em um contexto de estagnação do mercado consumidor da região, e de redução da abrangência geográfica das cadeias de produção.

Estudos empíricos mostram que as iniciativas americanas adotadas nos anos 90 tiveram efeitos positivos sobre os fluxos de comércio dos países-membros. Entretanto, quando se observam os dados sobre competitividade comercial das principais economias das Américas – Argentina, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, México e Estados Unidos –, somente a experiência mexicana mostra-se exitosa nos últimos 30 anos.

O México é o único país a reforçar sua competitividade no comércio internacional nas etapas finais do processo de produção, nomeadamente nas exportações de bens de capital – sucesso parcialmente associado à sua proximidade geográfica com os Estados Unidos. Por outro lado, as outras economias destacam-se por reforçar os níveis de competitividade no comércio de produtos primários.

O modelo chileno, muito presente no debate público brasileiro e que se baseia em acordos bilaterais com diversas regiões, mostra-se aquém do otimismo difundido. Os resultados da estratégia chilena reforçam o perfil primário-exportador, sem apresentar ganhos de inserção competitiva em outras etapas do processo produtivo.

Por sua vez, o modelo brasileiro mostrou resultados positivos apenas na primeira década, ao aumentar ou manter a competitividade do Brasil em todos os setores. Contudo, o país é impactado pelo desaparecimento gradual dos efeitos do Mercosul após os dez primeiros anos – dada a relativa estagnação do processo de integração econômica.

Iniciativas relativamente recentes dos países americanos incorporam a emergência asiática, como o acordo entre Mercosul e Índia, a Parceria Transpacífica, e os acordos bilaterais em negociação com Coreia do Sul e Japão. Contudo, esses acordos não incluem em seu cômputo a redução geográfica das cadeias de valor. Corre-se o risco de as estratégias de inserção das Américas, à exceção de México e Estados Unidos, reforçarem o papel primário-exportador da região nas cadeias globais de valor, sobretudo as que passam a se concentrar na Ásia. Há que se repensar os processos de integração econômica nas Américas.

Publicado em jornal O TEMPO.

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