Conexão com Mercado | Ibmec Carreiras | Gestão e Políticas Públicas

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Tempo estimado de leitura: 13 minutos

O Conexão com Mercado desse mês conversou com Ricardo Batista sobre a área de Gestão de Políticas Públicas e levantou não só sua opinião sobre o segmento, mas também dicas e orientações sobre os desafios e como o profissional pode se preparar para atuar nessa área.

Ricardo Batista

Ricardo é bacharel em Ciências Sociais pela UFSCar e mestrando em Sociologia pela USP. Atuou com os temas do federalismo e das políticas públicas por 6 anos na Frente Nacional de Prefeitos em áreas e projetos de Finanças e modernização da Gestão Pública, Consórcios Públicos, Saúde, Desenvolvimento Econômico e Assistência Social. Foi coordenador do projeto de Fortalecimento da Estratégia ODS. Hoje é coordenador de Políticas Públicas no GIFE.

1. Qual a sua história com a área de Políticas Públicas?

Ricardo = Minha família sempre foi muito politizada e sempre incentivou eu e meus irmãos a olharmos o mundo por meio das lentes da política, entendendo assim que os fenômenos e acontecimentos que vivenciamos são resultados de decisões e disputas políticas, seja pela defesa de interesses e pautas de grupos sociais diversos, seja pela reivindicação de direitos, reconhecimento e conquistas de segmentos da sociedade em busca de justiça e legitimidade. Dessa forma sempre estive envolvido em discussões sobre o sentido das políticas públicas e seus efeitos, mesmo antes da graduação, no ensino médio e espaços de articulação juvenil. Na graduação em Ciências Sociais na UFSCar pude aproveitar do contexto enriquecido pelos debates acalorados que ocorriam nos anos 2007, 2008 e 2009 sobre as políticas públicas de acesso ao ensino superior como o Reuni, por exemplo. Já formado, em 2012, parti para Brasília no intuito de buscar oportunidades que pudessem incrementar rapidamente minha experiência com as políticas públicas num ambiente privilegiado porque próximo dos centros de poder, decisão, coordenação e formulação de políticas. Trabalhei na Câmara dos Deputados com o então presidente da Comissão de Educação e Cultura, à época ocupado em garantir alternativas de financiamento para o PNE. Foi um período muito rico de aprendizado sobre o funcionamento do parlamento, das articulações políticas, das estratégias de arregimentação de apoio e convencimento político dos atores chave. Em janeiro de 2013 fui convidado pela Frente Nacional de Prefeitos (FNP) para trabalhar com os municípios muito populosos com alta vulnerabilidade social e baixa receita pública, o chamado g100. A partir daí tive a oportunidade de discutir praticamente todas as dimensões das políticas públicas nos mais amplos arcos temáticos com foco na redução das desigualdades sociais e federativas. Em parceria e articulação com diversos órgãos de pesquisa e planejamento da administração federal como IBGE, IPEA, MDS, INEP, entre outros, fiz parte da equipe que formulou o índice g100, que ponderava a relação entre vulnerabilidade social e capacidade financeira dos municípios. Esta construção estatística permitiu com que conquistássemos pela FNP uma série de medidas e políticas públicas que priorizassem esse grupo de municípios junto ao Governo Federal como no Mais Médicos, no Brasil Sem Miséria, no Programa de Modernização da Administração Tributária (PMAT) e etc. Foi nesta época que conseguimos financiamento da União Europeia para o projeto de fortalecimento institucional do g100, que coordenei entre 2013 e 2015, e que me rendeu noções aprofundadas de gestão de projetos e de redes de parceiros. Depois dele pude coordenar outros projetos financiados pela UE e outros financiadores, trabalhando projetos de escala para a rede de municípios da FNP nos variados temas, dos consórcios públicos à mobilidade urbana, das finanças municipais à assistência social, da inovação aos ODS. Em 2016 me mudei de Brasília para São Paulo onde segui trabalhando como gestor de projetos, revisor e supervisor de publicações técnicas, ampliando o arco de parceiros institucionais da FNP e gerando conexões entre gestores públicos, think tanks e investidores sociais que atuavam com o tema das cidades e da gestão pública. Em fevereiro de 2019 assumi a coordenação do projeto de fortalecimento institucional da rede Estratégia ODS pela Fundação Abrinq. Nesta posição coordenei a estruturação do projeto e da articulação dele com a rede assumindo representação institucional do projeto em colegiados oficiais municipais e estaduais e gerindo os grupos de trabalho. Após concluir o processo de planejamento e estruturação do projeto, cheguei no GIFE para assumir a função de Coordenador de Políticas Públicas onde atuo buscando promover o adensamento dos temas da agenda pública no setor do investimento social privado. Meu trabalho no dia a dia é promover maior cooperação entre organizações do ISP de forma que possam trabalhar cada vez mais integradas, coordenadas e articuladas, endereçando contribuições cada vez mais estruturantes e estruturadas para a sociedade nos diversos temas da agenda pública. Outra frente fundamental do trabalho é o fortalecimento de temas da agenda pública fundamentais do nosso tempo presente em que o campo da filantropia ainda investe pouco, principalmente por meio do projeto “O que o Investimento Social Privado pode Fazer por…”. Por fim, também trabalho pela disseminação e conexão das soluções públicas desenvolvidas pelo ISP junto aos policy makers, procurando multiplicar e dar escala aos projetos do setor.

2. Como podemos diferenciar a Gestão de Políticas Públicas da Administração Pública e no que elas se relacionam?

Ricardo = Há diversas interpretações e noções de diferenças entre a administração pública e a gestão de políticas públicas e como elas se aproximam, se influenciam e se modificam mutuamente. Numa perspectiva mais ampla, a administração pública diz respeito às formas, rituais, instrumentos, princípios e cultura que regem o funcionamento do Estado e dos entes públicos. Estão implicados aí as dimensões diversas do direito, as várias concepções de teoria geral do Estado, a contabilidade e as finanças públicas, o planejamento, a análise da anatomia das estruturas do setor público, a economia, os processos de decisão e de fiscalização e controle, entre outros. Já a Gestão de Políticas Públicas compreende as teorias, técnicas e modelos de concepção, elaboração, planejamento, avaliação e gerenciamento da ação e da agenda pública. Ambas se relacionam na medida em que podemos entender que dentro das regras gerais do Estado, a Gestão de Políticas Públicas confere orientação de sentido, de ritmo e coordenação para o funcionamento da administração pública, muitas vezes modificando-a, introduzindo elementos de inovação, atualização e aprimoramento nela. Um bom exemplo dessa relação entre Administração Pública, compreendida como o conjunto de elementos conformadores do Estado, e a Gestão de Políticas Públicas, como as formas e modelos de orientação da ação governamental, é a transformação de programas, projetos e políticas de governo em políticas de Estado. A riqueza desse processo pode ser observada desde as esferas nacionais, mais estratégicas, até às municipais, mais locais e capilares, onde muitas formas de gestão do território por meio da combinação entre instrumentos da administração pública com modelos de gerenciamento de projetos e conceitos diversos de políticas públicas nas diferentes áreas temáticas que vão da mobilidade urbana à saúde, dos tributos ao manejo e destinação dos resíduos sólidos, pode contar com formulações extremamente contemporâneas e sofisticadas, inspiradas ou conectadas às agendas do nosso tempo como a relação com as mudanças climáticas, as desigualdades sociais, as transformações demográficas, a informatização, entre diversas outras. Se pudesse fazer uma analogia esportiva, diria que a administração pública é o conjunto formado pelo campo de futebol, pelas regras e normas que disciplinam o jogo e pela atuação da arbitragem no cumprimento dessas regras durante a partida. Já a gestão de políticas públicas pode ser entendida como a elaboração da estratégia e o funcionamento do esquema tático de jogo dos times sob coordenação dos treinadores.

3. É um segmento que exige quais competências e conhecimentos?

Ricardo = A área de gestão de políticas públicas pode exigir diferentes tipos de competências a depender dos temas aos quais o profissional estará dedicado. Por exemplo, é desejável que um profissional que atue no tema da educação possua conhecimento sólido e consistente, teórico e empírico sobre a área. Por outro lado, podemos elencar algumas competências, habilidades e conhecimentos que são transversalmente necessários e desejáveis para os profissionais que atuam com a Gestão de Políticas Públicas, como noções e conceitos de gestão de projetos, planejamento e gerenciamento de processos, avaliação e monitoramento de indicadores, conhecimento avançado sobre administração pública, entre diversas outras mais ligadas à facilitação, racionalidade e fluxo de processos. É essencial para o profissional de Gestão e Políticas Públicas desenvolver capacidade de fazer análise crítica e política, identificar os atores, suas vozes e seus interesses. É muito comum que na aquisição de novos conhecimentos e fortalecimento das capacidades em Gestão de Políticas Públicas, se foque bastante nas metodologias e nas técnicas gerenciais, na racionalização de procedimentos etc. Mas não se pode jamais esquecer que a Política é a dimensão fundamental nesse processo, pois é ela quem dá o sentido da gestão e é a partir dela que é possível construir consensos e caminhos possíveis entre atores diversos envolvidos na elaboração, no desenvolvimento, na implementação e eventualmente nas disputas em torno da gestão das políticas públicas. Alguns outros conhecimentos são muito preciosos para uma boa trajetória nessa área, como noções de economia e ciências sociais, entendimento sobre o sistema federativo brasileiro, conhecimento sobre democracia, processo decisório, instituições da República e participação cidadã. Uma outra dimensão que vem ganhando cada vez mais relevância em sua interface com a gestão de políticas públicas é o advocacy, que trata do trabalho sistemático de convencimento e sensibilização estratégica dos tomadores de decisão e legisladores para a defesa e promoção de determinada agenda ou conjunto de agendas públicas e que pode influenciar ou ser influenciado pela Gestão das Políticas Públicas na medida em que fornece referências de caminhos, arranjos e modelos de implementação delas.

4. Olhando a trajetória desse setor no Brasil: quais desafios ainda precisam ser trabalhados e, em sua opinião, qual a perspectiva para o setor?

Ricardo = A Gestão de Políticas Públicas tem demonstrado alargado potencial de abrigar, aproveitar e desenvolver diferentes competências que transitam dos níveis mais táticos e operacionais até os mais estratégicos e deliberativos. Isso reflete a ascendência que o aprimoramento das políticas públicas e suas práticas de gestão tem conseguido alcançar por meio da multiplicação de casos bem-sucedidos de projetos, iniciativas e articulações, sejam promovidas por gestores públicos, seja por meio do crescimento da oferta de cursos de gestão pública na rede de ensino superior e escolas de governo, seja através de programas de organizações da sociedade civil e do investimento social privado. Por isso cada vez mais é necessário valorizar a carreira de gestor e gestora pública com mais concursos públicos e salários atrativos, já que há crescente demanda pela inteligência em planejamento, análise e avaliação das políticas e da gestão pública em diversos setores da sociedade como expressão da necessidade de racionalização do Estado no sentido de melhorar o impacto e alcance das políticas públicas, e também de economizar recursos públicos.  Um desafio crucial a ser superado também é o da necessidade de se aprofundar e fortalecer a disseminação da cultura da gestão pública baseada em evidências como forma de construir e fundamentar boas práticas e decisões mais assertivas, equilibradas e racionais das autoridades, dirigentes e profissionais da gestão e políticas públicas. Para expandir a cultura de gestão com base em evidências é preciso sobretudo produção de conhecimento por meio de formação e qualificação profissional, pesquisas, diagnósticos, transparência e fortalecimento das políticas e iniciativas de dados abertos. Com dados e informações públicas disponíveis e oferta de formação e pesquisa, a gestão de políticas públicas pode continuar gerando contribuição e impacto relevante e crescendo enquanto campo profissional. 

Por fim, não se pode deixar de mencionar a tecnologia e a informatização como desafios para a gestão e políticas públicas em nosso país hoje. Os gargalos tecnológicos, de infraestrutura e qualificação de profissionais, limitam fortemente o avanço da gestão e políticas públicas enquanto agenda de trabalho e campo de pesquisa aplicada que pode contribuir para a melhoria das políticas públicas e aprimoramento do estado. Neste sentido, é preciso aprimorar e democratizar a infraestrutura de conectividade e criar incentivos e mecanismos para a informatização do setor público. Por outro lado, tem crescido muito a oferta de empresas, think-tanks e startups que desenvolvem soluções, plataformas e conhecimento tecnológicos para gestores públicos, as famosas Govtechs, bem como aconselhamento estratégico, cenários de futuro e assessoramento de governos visando melhorar e fortalecer a cultura de gestão e planejamento na administração pública. Na minha visão, esse movimento tem ajudado a fortalecer e oxigenar o mercado de trabalho na gestão de políticas públicas hoje.

5. Como o profissional pode se preparar e se manter atualizado sobre o segmento?

Ricardo = Hoje é relativamente fácil se manter atualizado sobre o tema da gestão de políticas públicas. Muitas organizações de diversos setores investem na área, e há farta oferta de eventos, publicações e plataformas sobre o tema. Participar de redes e grupos temáticos e representativos é um jeito muito eficaz para receber e consumir atualizações e conteúdos da agenda, pois é comum e natural que conhecimentos diversos circulem entre os membros das redes, além das redes serem excelentes ambientes de networking. Se especializar acadêmica ou profissionalmente no segmento também é fundamental para se preparar para os desafios da agenda e para o mercado de trabalho. O uso das redes sociais para acompanhar e se aproximar de pessoas e organizações de referência na gestão de políticas públicas também é essencial. E mais do que tudo, aproveitar oportunidades para ganhar e diversificar experiências práticas trabalhando pela gestão de políticas públicas, na minha visão, é o meio mais completo de se atualizar e se preparar. Nada como colocar a mão na massa para aumentar expressivamente o repertório do profissional desta área e fazer cada vez mais diferença. 

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