Inteligência artificial irá mudar profissões?

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Tempo estimado de leitura: 7 minutos
Enquanto veículos elétricos voadores ainda não passam de planos, a IA retrata protótipos futuristas nas ruas de São Paulo. O modelo na imagem não existe nos projetos das empresas que tentam desenvolver essa tecnologia

Por diferentes caminhos, estudiosos tentam antecipar o impacto que a nova era da inteligência artificial (IA) generativa terá no mercado de trabalho e no emprego das pessoas.

É a primeira vez que essa tecnologia provou ser capaz de substituir os humanos em diferentes tarefas, como cálculo de impostos, avaliações complexas de seguros, escrita de um texto ou produção de uma imagem.

A chegada do ChatGPT

A chegada do ChatGPT, em novembro do ano passado, e de outras ferramentas mais avançadas de IA mostram potencial para substituir profissionais em funções que, acreditava-se até então, exigiriam aptidões inerentemente humanas, como mídia, publicidade, jurídico, finanças, educação e até mesmo tecnologia.

Se antes as máquinas substituíam as pessoas em funções mais operacionais e repetitivas, agora é consenso que até profissões que exigem habilidades mais sofisticadas estão em risco – ou, ao menos, serão profundamente alteradas.

Se por um lado especialistas acreditam que isso representará um salto de produtividade sem paralelo recente, por outro veem também uma forte redução nos postos de trabalho.

A velocidade e a magnitude como isso vai acontecer, entretanto, ainda estão no campo da especulação porque dependem de variáveis como novas regras trabalhistas, regulação do uso de IA pelas empresas e políticas públicas de formação de mão de obra qualificada para esse novo mundo do trabalho. E essas regras ainda não foram definidas na maioria dos países, incluindo o Brasil.

Um mundo novo de trabalho

A boa notícia é que novos postos de trabalho, que exigem mais qualificação e tendem a pagar melhores salários, serão criados nesse novo mundo do trabalho, embora não na mesma velocidade que as vagas serão fechadas.

Shelly Palmer, consultor de tecnologia e negócios e professor de Mídia Avançada na Universidade de Siracusa, em Nova York, pontua que há uma profunda diferença entre perder o emprego para uma máquina (o que acontece desde o advento da automação) e perder o emprego para outra pessoa que desenvolveu habilidades que você optou por não desenvolver.

– É altamente improvável que a IA ‘roube’ seu trabalho. É muito mais provável que um de seus amigos, colegas ou concorrentes aprenda a usar a IA para aumentar sua produtividade e, por ser mais produtivo, ocupe seu posto – diz Palmer, que recomenda que as pessoas aprendam a usar e estudem sempre as novas ferramentas de IA.

– Não importa o quão inteligente você pense que é, há coisas que um sistema de IA bem treinado pode fazer melhor do que você.

Quando se fala em números, a chegada da IA generativa pode se parecer mais com um evento de destruição em massa de postos de trabalho – e por isso causa tanto alarmismo. Pesquisadores do banco americano Goldman Sachs, por exemplo, preveem a perda de 300 milhões de postos de trabalho com a automatização.

O relatório do Goldman estima que 18% do trabalho global poderiam ser informatizados, com os efeitos sentidos mais profundamente nas economias avançadas do que nos mercados emergentes.

Segundo o banco, países desenvolvidos serão mais afetados, em parte porque os trabalhadores de ‘colarinho branco’ correm mais riscos do que os braçais. Espera-se que profissionais das áreas de Administração e Direito sejam os mais afetados, afirma o Goldman Sachs, em comparação com o ‘pequeno efeito’ observado em ocupações fisicamente exigentes e menos digitalizadas, como construção e reparos.

O outro lado da moeda é o impacto positivo no crescimento econômico. O estudo do Goldman Sachs prevê que a adoção generalizada da IA pode aumentar a produtividade do trabalho – e elevar o PIB global em 7% ao ano durante um período de dez anos.

Palmer lembra que a produtividade tem aumentado exponencialmente nos últimos anos. É só pensar como atividades cotidianas, como agendamento de viagens, compras ou busca de informações, são hoje bem mais simples do que em 2020.

– Quase todo CEO insistirá em usar IA para levar a produtividade ao limite. A vantagem competitiva é muito grande se você for o primeiro – diz Palmer.

Especialistas alertam, porém, que, mesmo antes da nova era da IA generativa, os ganhos de tecnologia dos últimos anos resultaram em um aumento grande da desigualdade de renda entre profissionais muito qualificados (e com altos salários) e os que estão na base da pirâmide. Com o novo salto tecnológico, esse contexto tende a se aprofundar.

– Precisamos, neste momento, de regulação e governança, de um debate multilateral, para direcionar essas mudanças.

Será preciso mesmo substituir tantos postos de trabalho por automação? – questiona Gustavo Macedo, professor de Relações Internacionais e que também leciona a disciplina Ética e Inteligência Artificial no Ibmec-SP.

Alarmismo e futurismo

Macedo cita o exemplo de alguns escritórios de advocacia, nos quais os estagiários que levantavam dados para embasar processos já foram substituídos por ferramentas de IA. Mas destaca que há um certo alarmismo em números e estimativas que preveem cortes de emprego, que, segundo ele, não passam de ‘exercício de futurismo’.

Segundo o economista Leonardo Monasterio, as previsões sobre o impacto da IA no trabalho têm sido revistas, uma vez que não se concretizam de forma linear. Ele observa que a nova fase da IA avança em posições que misturam atividades repetitivas e cognitivas, como preencher uma planilha, transcrever áudios ou traduzir textos.

Ainda assim, tarefas como a conversa entre um médico e seu paciente ou a apresentação de um palestrante ou professor são mais difíceis para as máquinas. No entanto, os dois profissionais provavelmente terão melhores chances se souberem aplicar a IA no seu cotidiano para ganhar produtividade, diz Monasterio.

A própria indústria de computação está no alvo da IA. De um lado, a IA assume tarefas como as de criação ou complementação de códigos, geração de relatórios e otimização de fluxos de trabalho. Por outro, muitos profissionais de tecnologia podem dedicar mais tempo ao treinamento dessas máquinas, aperfeiçoando modelos de linguagem para torná-las mais assertivas. São os chamados ‘engenheiros de prompt’.

– Na indústria de biofármacos, por exemplo, a IA pode gerar dados sobre milhões de moléculas possíveis para a cura de uma determinada doença e, em seguida, testar suas aplicações, acelerando de forma significativa os ciclos de pesquisa e desenvolvimento de medicamentos e vacinas.

O que a IA é capaz de fazer?

O Goldman Sachs resumiu as diferenças práticas entre a atual inteligência artificial (generativa) e as ferramentas que existiam até então, chamadas de IA analítica.

Textos

  • IA analítica: classifica e avalia textos.
  • IA generativa: responde a questões textuais complexas com linguagem e estrutura gramatical natural, indistinguível da humana.

Imagens

  • IA analítica: faz reconhecimento facial e de imagens.
  • IA generativa: cria imagens originais (como as que ilustram esta página), gráficos e vídeos, baseada nos comandos dos usuários.

Dados

  • IA analítica: realiza previsões e inferências estatísticas.
  • IA generativa: gera códigos de programação e explica como eles podem ser usados em outras aplicações.

Reportagem publicada no jornal O Globo: clique aqui e leia na íntegra!

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